Contos de Grimm: "A parceria do gato e da ratinha"


(Título original: Cat and mouse in partnership)

Conto de fadas popularizado pelos Irmãos Grimm
Tradução e adaptação por Marlo George

Um gato conheceu uma ratinha, e lhe falou tanto sobre o grande amor e amizade que sentia por ela, que no final a ratinha concordou que eles deveriam viver juntos, na mesma casa. "Mas precisaremos nos preparar para o inverno, ou poderemos passar fome," disse o gato, "e você, ratinha, não pode ficar se aventurando por aí, para não ser pega por alguma armadilha qualquer."

Esse bom conselho foi seguido, e eles adquiriram um pote de gordura, mas não tinham onde guardá-lo. Finalmente, após muito debaterem sobre o assunto, o gato disse, "Não conheço nenhum lugar melhor para guardá-lo do que na igreja. Ninguém se atreveria a tirar nada de lá. O colocaremos próximo ao altar, e só o pegaremos quando precisarmos."

Assim, o pote foi guardado lá, em segurança, mas não demorou muito, até que o gato ficasse ansioso com isso, e disse para a ratinha, "Eu gostaria de contar pra você, ratinha, que minha prima teve um filhote e me pediu para ser seu padrinho. Ele é branco com manchinhas marrons, e eu terei de batizá-lo. Precisarei ficar fora o dia todo, e preciso que tome conta da casa sozinha."

"Sim, sim," disse a ratinha. "Por tudo que há de mais sagrado, vá, e se conseguir algo de bom para comer, não deixe de lembrar de mim. Eu gostaria muito de tomar umas gotinhas de vinho de batismo."

Mas tudo que o gato disse, de todo modo, era mentira. Ele não tinha prima nenhuma, e não lhe foi proposto ser padrinho de ninguém. Ele saiu de casa e foi diretamente para a igreja, pegou o pote de gordura e começou a lambê-lo. Farto, foi passear pelos telhados da cidade, procurando por aventuras. Depois esticou-se ao sol, lambendo os bigodes sempre que pensava no pote de gordura. Não voltou para casa antes do anoitecer. "Ora, ora, vejo que voltou," disse a ratinha. "Você deve ter tido um dia muito legal."

"Tudo correu bem," respondeu o gato.

"Qual o nome que sua prima deu para o seu afilhado?" perguntou a ratinha.

"Foi-Aberto," disse o gato, bem calmo.

"Foi-Aberto?" espantou-se a ratinha. "Esse é um nome bem estranho e incomum. Nomes estranhos são comuns na sua família?" 

"O que isso importa?" disse o gato. "Não é tão ruim quanto Rouba-Migalhas, como seus afilhados são chamados."

Um bom tempo depois, o gato foi tomado por mais uma crise de ansiedade. Ele disse à ratinha, "Você poderia me fazer um favor, e tomar conta da casa mais uma vez. Me foi feito outro convite para ser padrinho, e como o filhotinho tem uma manchinha branca em volta do pescoço, eu não pude recusar." 

A boa ratinha consentiu. Porém, o gato caminhou pelo muro da cidade até a igreja, e devorou metade do pote de gordura. "Nada tem um gosto tão bom, quanto aquilo que comemos sozinho," disse ele, e sentiu-se muito satisfeito naquele dia. Quando voltou pra casa, a ratinha perguntou-lhe, "Com que nome o filhote foi batizado?"

"Metade-Se-Foi," respondeu o gato.

"Metade-Se-Foi? É isso que está dizendo? Eu nunca ouvi tal nome em toda minha vida. Aposto que não está em nenhuma lista de nomes de bebês."

Novamente, algum tempo depois, a boca do gato começou a aguar, de tanto pensar no delicioso pote de gordura. "Tudo que há de bom, vem em dose tripla," disse o gato à ratinha. "Fui novamente convidado para ser padrinho. O filhote é todo pretinho, mas com patinhas brancas. Não há mais nenhum pelinho branco em todo o resto de seu corpinho. Isso só acontece uma vez na vida. Você me deixará ir, não é mesmo?" 

"Foi-Aberto. Metade-Se-Foi," resmungou a ratinha. "São nomes muito estranhos, mas eles fizeram-me parar e pensar." 

"Te fizeram parar e pensar? Pensar no que? Você fica aqui em casa sentada o dia inteiro," disse o gato, "com seu casaco cinza escuro e sua comprida trança, fantasiando. Fantasias porque não sai para ver a luz do dia."

Enquanto o gato esteve ausente, a ratinha limpou a casa, e pôs tudo em ordem. Mas o gato, ganancioso, devorou o que restava de gordura no pote. "Eu só teria paz depois que tivesse comido isso tudo," ele disse para si mesmo. Satisfeito e gordo, ele não voltou para casa até que a noite chegou. A ratinha, rapidamente, perguntou-lhe que nome fora dado para o filhotinho que ele teria batizado.

"Acredito que também não gostarás do nome desse meu novo afilhado," disse o gato. "Ele foi batizado como Tudo-Se-Foi."

"Tudo-Se-Foi!," disse a ratinha. "Esse é o pior de todos. Eu nunca ouvi esse também. Tudo-se-Foi! O que significa?" Então ela sacudiu negativamente a cabecinha, espreguiçou-se, e se pôs a dormir.

À partir daquele dia, ninguém mais convidou o gato para batizar nenhum outro filhote, mas quando o inverno chegou e não havia mais nenhuma comida à ser encontrada do lado de fora de sua casa, a ratinha lembrou-se do pote de gordura, que ambos tinham guardado na igreja.

"Vamos gato, vamos pegar o pote de gordura que guardamos para o tempo de necessidade. Ele viria bem a calhar, agora que não temos mais nada para comer."

"Sim," respondeu o gato. "Você vai gostar tanto da gordura, quanto gostará de ir lá fora."

Assim, saíram e partiram em direção à igreja, mas quando lá chegaram, o pote de gordura estava, como você pode supor, vazio. "Eureca!," disse a ratinha, "agora descobri o que aconteceu. Agora tudo está esclarecido. Você é um verdadeiro amigo. Comeste tudo enquanto estavas batizando os filhotinhos. Primeiro Foi-Aberto, depois Metade-Se-Foi, e então..." 

"Quieto!" gritou o gato. "Uma palavra a mais e eu a comerei também."

"Tudo-Se-Foi."

O nome mal saiu dos lábios da pobre ratinha. O gato pulou sobre ela, a agarrou e a engoliu depressa. Viu! É assim que o mundo funciona.

FIM

Fonte: Grimmstories.com
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