Contos de Perrault: As Fadas


(Título original: Les Fées)

Conto de fadas popularizado por Charles Perrault, em 1697
Tradução por Marlo George
Ilustração de Gustave Doré (1867)


Tempos atrás havia uma viúva que tinha duas filhas. A mais velha era muitas vezes confundida com a mãe, pois eram muito parecidas, tanto no que diz respeito ao seu gênio, quanto ao seu aspecto. Ambas eram tão desagradáveis e arrogantes que ninguém gostava de tê-las por perto.

A caçula, que era doce e gentil como seu finado pai, era uma das mais belas moças que se possa imaginar. A mãe tinha certa predileção pela filha mais velha, por causa de tudo que tinham em comum, e desgostava da mais nova, forçando-a a fazer suas refeições na cozinha e a trabalhar arduamente o dia inteiro, até que a noite chegasse.

Uma das tarefas que a pobre garota tinha que cumprir era ir buscar água, duas vezes ao dia, em uma fonte que ficava à meia milha de distância. Para isso usava um grande jarro. Um dia, quando ela estava na fonte, uma velha mulher veio até ela e pediu um pouco de sua água para beber.

– Mas é claro! – disse a bela garota. Pegou um jarro e o encheu com água da parte mais limpa da fonte e, ajudou a velha senhora a levantá-lo, para que fosse mais fácil beber dele.

Acontece que a velha mulher era uma fada, que disfarçara-se de velha pedinte para ver como a menina, que era bondosa, se comportaria.

– Você é tão linda – disse a velhota, ao terminar de beber – e também muito educada, tanto que irei presentear-lhe com um encanto. Cada vez que você falar uma flor ou uma pedra preciosa cairá de sua boca – determinou a fada.

Quando a bela garota voltou pra casa, sua mãe a repreendeu por ter passado tanto tempo na fonte.

– Peço seu perdão, mamãe, por ter me demorado tanto – clamou a menina, e enquanto dizia isso, três rosas, três pérolas e três grandes diamantes caíram de sua boca.

– O que significa isso? – gritou a mãe – É inacreditável! Teria eu acabado de ver pérolas e diamantes caírem de sua bocarra, minha filha?

Vale ressaltar que aquela foi a primeira vez que a repugnante senhora chamou a bela caçula de filha.

A pobre caçula contou tudo que havia ocorrido, cuspindo vários diamantes conforme ia falando.

– Tive uma grande ideia! – disse a mãe – Devo mandar minha filha mais velha lá. Venha cá, Fanchon. Veja o que acontece quando sua irmã fala! Gostaria de ter tal dom? Tudo que deves fazer é ir buscar um pouco de água lá na fonte, e quando uma velha mulher se aproximar, ofereça água pra ela, mas o faça com graciosidade.

– Você está me mandando ir buscar água lá na fonte? – disse a filha mal educada.

– Estou mandando você ir – ordenou a mãe – imediatamente!

Mal humorada, a filha mais velha seguiu seu caminho carregando consigo a melhor bacia de prata da casa. Tão logo chegou à fonte, viu uma senhora magnificamente bem vestida, que vinha do bosque e que foi até ela, pedindo-lhe que lhe service um pouco de água. Tratava-se da mesma fada que aparecera para sua irmã, mais cedo naquele dia, mas que agora estava disfarçada como uma princesa, para verificar os modos da menina malcriada.

– Acha mesmo que eu viria até aqui só para te servir bebida? – disse a garota arrogante com rispidez – Acha que eu carreguei essa bacia de prata só pra te servir água nela? É, parece que sim! Pegue sua água você mesma!

– Você não é nada educada – disse a fada, sem demonstrar irritação – Muito bem! Em retribuição à sua falta de cortesia lhe lançarei um encanto. Para cada palavra que disser uma cobra ou um sapo irão cair de sua boca.

Quando sua mãe a viu de longe, gritou: – E aí, minha filha? Conseguiu o mesmo dom de sua irmã?

– Bem, mãe – respondeu a mais velha, e enquanto ela falava, uma serpente e um sapo caíram de sua boca.

– Pelos Céus! – disse a mãe, impressionada – O que é isso? Só pode ser culpa da sua irmã. Ela pagará por isso!

A mãe correu para casa, para punir a caçula, mas a pobre menina fugiu para o bosque mais próximo. Lá, o filho do Rei a encontrou, quando retornava para o castelo após um dia cansativo de caça. Viu como ela era bela, e perguntou-lhe por que uma pobre menina como ela estava ali, naquele bosque perigoso, sozinha e chorando.

– Infelizmente, Meu Senhor, minha mãe expulsou-me de casa.

E assim o filho do Rei viu que de sua boca caíram cinco ou seis pérolas e alguns diamantes. Ele exigiu que ela contasse-lhe como isso poderia ser possível, e a menina contou-lhe sua história.

O filho do Rei apaixonou-se por ela, e considerando que seu dom era mais valioso que qualquer dote que pudesse ser oferecido, a levou perante seu pai, no Palácio Real, e lá ele casou-se com ela.

Quanto à sua irmã descortês, tornara-se tão insuportável que sua própria mãe a expulsou de casa. Nunca mais ouviu-se falar dela, apenas que teria embrenhado-se no bosque e morrido.

FIM
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